02 agosto 2008

O Acampamento






A vontade de vencer os 6000 metros veio do Brasil. Na viagem cada integrante tinha direito a uma vontade, digamos assim. A do meu pai era ver o Pacifico e o meu era escalar uma montanha com neve. Fiquei sabendo que em Arequipa eu encontraria boas opções. Chegando lá já corri atrás de uma montanha e de um guia. Me disseram que para quem não tinha experiência eu só tinha uma opção que beirava os 6000 m, o vulcão El Misti. É a montanha mais destacada e com certeza a de maior fama da região. Disseram que a subida era puxada, mas valia a pena. Eles estavam certos.
Busquei companhia na família, mas cada um tinha uma desculpa. Fora de forma, não ter interesse no passeio...
Esperei um grupo se formar e fui.Meu grupo era o guia José, um casal neozelandês que morava em Londres, fascinados com os restaurantes a quilo do Brasil, e um alemão meio nerd.
Umas 8 da manhã pegamos um 4x4 e fomos aos pés do El Misti. O dia estava bem típico da região, sol intenso com vento bem seco.
Começamos a subida devagar e sempre. Concentrado na respiração. Logo no início pensei que minha mochila tava meio pesada, carregava uns 4 litros de água (essenciais), mal sabia eu que no final do dia o peso estaria insuportável.
Já conseguia ver toda Arequipa e suas redondezas, o sol estava se pondo e eu estava pedindo arrego quando José disse que iríamos acampar ali. Ótimo! O peruano fez uma espécie de miojo bem nutritivo. Armamos as barracas e fomos dormir. O José disse que iríamos reiniciar a subida as 2 e meia da manhã. O quê??? perguntei porque não poderíamos começar tipo umas...7. Aí ele respondeu que se eu conseguisse dormir até tal hora, ok! Ele tava certo. Mais ou menos meia noite acordei numa mega ventania que parecia que minha barraca ia sair voando, provocando um barulhão. Piorando tudo era o frio, muito frio. Não dava para relaxar. Tentei, mas nada. Uma da manhã eu tava quase indo acordar o José para a gente ir logo. Fiquei uma hora na agonia.
Umas 2 da manhã começaram as movimentações para a conquista do cume.
Deixamos praticamente tudo no acampamento base. Levamos água e umas barras energéticas. Começou o duelo.
A altitude, uns 5 mil metros, já começava a atrapalhar e o oxigênio já começava a ficar mais rarefeito. Conseguia distrair o cansaço e o esforço olhando para a linda vista dos cânions e das planícies desérticas que se encontravam sob a enorme sombra em forma de pirâmide do El Misti no nascer do sol.
Mas beirando o cume o frio virou o maior inimigo. não era mais possível se concentrar. Achava que minhas mãos e pés iam congelar. Gelo se formava na minha barba. O cansaço era tanto que já escalava por osmose enquanto travava uma árdua batalha psicológica contra o frio. O José disse que a sensação térmica àquela altitude chagava a menos 30° C. Eu acredito. Quando já enxergava a cruz que marcava o topo pensei em desistir. Não aguentava mais. Já via o cume, tinha praticamente a mesma vista que a lá de cima, para que continuar? Mas tirei força dos anos de farinha e continuei. O alemão, que deve ter pensado a mesma coisa que eu, ficou.
Os últimos passos foram surpreendentemente dolorosos. Nunca vou subestimar o frio e a altitude. Como foi difícil. Chegando, vi que estava errado. A vista era infinitamente mais bonita que a poucos metros abaixo. Não tinha nada a nossa frente, tudo estava abaixo. Era lindo. E melhor que isso era a sensação de tudo aquilo a meus pés depois de uma vitoriosa, porém árdua, batalha psíquica e física.
Sim, tinha uma cratera lá em cima. Era a boca do vulcão, do imponente El Misti com uns 60 metros de diâmetro. Dentro, um líquido amarelo, do enxofre, cheio de espuma e fumaça.
Não conseguimos ficar mais de 5 minutos curtindo a vitória. Frio. A descida foi mais rápida, bem mais rápida. Descemos pela parte mais íngreme da montanha. Era formado por areia vulcânica. A subida por este lado seria impossível, porque a cada passão a perna entraria até o joelho na areia. Porém na descida esta areia fofa amortiza os saltos gigantes que dávamos para baixo. A cada pulo deixávamos uns 20 metros para trás. Muito divertido. Em umas 2 horas estávamos no acampamento base. Pegamos nossas coisas e no fim da tarde estávamos entrando de volta na 4x4.

Beijos